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quarta-feira, 10 de agosto de 2011

ÚLTIMOS QUE SÃO PRIMEIROS - Parte 6


O Dia do Descanso


          Mais uma figura de "último" que passou a ser "primeiro" podemos identificar no chamado "dia do descanso". No sétimo dia Deus descansou de toda a Sua obra: "No sétimo dia Deus já havia concluído a obra que realizara, e nesse dia descansou" (Gênesis 2:2). Ordenou também Deus, como uma figura da obra que realizaria em Cristo, que o Seu povo reservasse um dia para descansar, a saber, o sábado, o último dia da semana. Cristo é o Senhor do sábado, e isso Ele deixou bem claro em Seus ensinamentos, porque só nEle encontramos o verdadeiro descanso. Assim, o sábado havia sido criado por causa do homem, e não o homem por causa do sábado (Marcos 2: 27 e 28). Bem por isso, Deus reservou um "descanso sabático" para o Seu povo, como figura do descanso que seria possível obter em Cristo.
            A obra de criação do mundo no Éden consumou-se com a formação do homem. A obra que Deus realizaria em Cristo, consumou-se com Sua morte e ressurreição: "Tendo-o provado, Jesus disse: "Está consumado!" Com isso, curvou a cabeça e entregou o espírito" (João 19:30). O Espírito de Deus foi o responsável pela ressurreição de Cristo, e também é o responsável por nossa ressurreição em Cristo, por nossa vivificação juntamente com Ele (Efésios 2: 4 a 7). O dia da ressurreição, portanto, é que efetivamente representa o "dia do descanso". Somente em Cristo, mortos para o pecado e vivos para Deus nEle, é que encontramos o verdadeiro descanso: "Venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso. Tomem sobre vocês o meu jugo e aprendam de mim, pois sou manso e humilde de coração, e vocês encontrarão descanso para as suas almas. Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve" (Mateus 11: 28 a 30); ""Felizes os mortos que morrem no Senhor de agora em diante". Diz o Espírito: "Sim, eles descansarão das suas fadigas, pois as suas obras o seguirão"" (Apocalipse 14:13).
            A partir da ressurreição e por causa dela, o "dia do descanso", que antes era o último dia da semana, passou a ser o primeiro, isto é, o domingo. Esta a razão pela qual a igreja primitiva passou a reunir-se no domingo. Em Cristo nós entramos no verdadeiro descanso, quando Cristo passa a ser a nossa vida; nosso fardo foi carregado nEle, e nós passamos passamos a carregar o Seu fardo leve, e a viver sob o Seu jugo suave. No domingo, portanto, celebramos o descanso que Cristo conquistou para nós, e que nós conquistamos nEle, mediante a fé que nos foi outorgada pela ação da Palavra e do Espírito.
  

Conclusão

            Não há qualquer expressão sem sentido nas palavras, nos ensinamentos de Jesus. Aquela que para mim era uma das mais intrigantes passou a ser uma das mais importantes, desde que me foi revelada a sua extensão e profundidade. Possivelmente ainda há muito o que se extrair da verdade de que "últimos" são e serão "primeiros". Para mim, é suficiente saber que Deus me fez participante do Seu Reino, tendo-me assentado nas regiões celestiais em Cristo, transportando-me do reino das trevas para o Reino do Filho do Seu amor.

"Não tenha medo. Eu sou o Primeiro e o Último. Sou Aquele que Vive. Estive morto mas agora estou vivo para todo o sempre"; "Estas são as palavras daquele que é o Primeiro e o Último, que morreu e tornou a viver" (Apocalipse 1: 17 e 18; Apocalipse 2:8)
 

terça-feira, 9 de agosto de 2011

ÚLTIMOS QUE SÃO PRIMEIROS - Parte 5

  Criação do Mundo e Criação em Cristo
          
          Como já dissemos, o homem primeiramente foi feitura de Deus. Deus deixou o homem por último na obra de criação do mundo, e ainda assim resolveu fazê-lo do pó. Todas as outras coisas foram criadas pelo poder de Sua Palavra. O "homem vermelho", Adão, não. Adão e Eva, conforme foram feitos, não estavam acabados. Deus pretende criar as coisas em Cristo. Somente quando somos regenerados pelo poder da Palavra e do Espírito Santo é que nos tornamos participantes do Reino e da natureza divina. Em Adão, isto é, no nascimento natural, somos por assim dizer os últimos na ordem da criação. Em Cristo, nós nos tornamos as primícias da criação de Deus: "Por sua decisão ele nos gerou pela palavra de verdade, a fim de sermos como que os primeiros frutos de tudo o que ele criou" (Tiago 1:18); "Pois da mesma forma como em Adão todos morrem, em Cristo todos serão vivificados. Mas cada um por sua vez: Cristo, o primeiro; depois, quando ele vier, os que lhe pertencem" (I Coríntios 15: 22 e 23); "Foram comprados dentre os homens e ofertados como primícias a Deus e ao Cordeiro. Mentira nenhuma foi encontrada em suas bocas; são imaculados" (Apocalipse 14:4-b). Isto porque foi do agrado do Pai fazer em Cristo novas todas as coisas, para que Cristo em todas as coisas tivesse a primazia (ou, a supremacia): "Ele é a cabeça do corpo, que é a igreja; é o princípio e o primogênito dentre os mortos, para que em tudo tenha a supremacia. Pois foi do agrado de Deus que nele habitasse toda a plenitude, e por meio dele reconciliasse consigo todas as coisas, tanto as que estão na terra quanto as que estão nos céus, estabelecendo a paz pelo seu sangue derramado na cruz" (Colossenses 1:18 a 20).     
          Se na primeira geração (a do Éden) o ser humano foi o último, na geração em Cristo (a da cruz e da ressurreição) ele passa a ser o primeiro, pois somente quando todos os eleitos forem regenerados em Cristo, somente quando o remanescente for salvo, virá o fim, e serão formados novos céus e nova terra.
           Que privilégio sabermos que em Cristo temos a primazia agora e nEle teremos a primazia eternamente!
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CONTINUA...

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

ÚLTIMOS QUE SÃO PRIMEIROS - Parte 4


Adão e Cristo
             
          Adão foi o primeiro representante da raça humana. Cristo, o último representante da raça adâmica. Adão era "um tipo daquele que haveria de vir" (Romanos 5:14). Por Adão entrou o pecado no mundo. Por Cristo Jesus, a dádiva, a graça que "decorreu de muitas transgressões e trouxe justificação" (Romanos 5:16).       

           Adão foi formado da terra; ele era feitura de Deus. Sob esse prisma, Deus não criou Adão, mas o transformou de uma mistura de pó e vento (sopro nas narinas). O homem é "pó em pé". O primeiro Adão tornou-se alma vivente. O último Adão, Espírito vivificante (I Coríntios 15:45). Adão foi o primeiro homem, formado do pó da terra. Cristo, o segundo homem, gerado dos céus, do Espírito Santo (I Coríntios 15:47).
            Portanto, mais um exemplo de "último" que se tornou "primeiro" é Cristo. Como Jesus Cristo, isto é, como o Deus-homem que veio e morreu em carne, Ele foi o último representante da raça adâmica (a qual foi destruída na cruz). Como Cristo Jesus, o primeiro representante de uma nova raça, uma nova geração, criada à Sua semelhança. Cristo é o primogênito dentre os mortos precisamente porque a partir de Sua ressurreição, e através dela, muitos outros filhos de Deus seriam igualmente gerados da morte, mediante a fé que haveria de se manifestar, e que se tem manifestado. Cristo Jesus foi o primeiro que ressuscitou, e nós temos crido que ressuscitamos juntamente com Ele, e temos nos tornado co-herdeiros do Reino dos Céus: "Pois sabemos que o nosso velho homem foi crucificado com ele, para que o corpo do pecado seja destruído, e não mais sejamos escravos do pecado; pois quem morreu, foi justificado do pecado. Ora, se morremos com Cristo, cremos que também com ele viveremos. Pois sabemos que, tendo sido ressuscitado dos mortos, Cristo não pode morrer outra vez: a morte não tem mais domínio sobre ele. Porque morrendo, ele morreu para o pecado uma vez por todas; mas vivendo, vive para Deus. Da mesma forma, considerem-se mortos para o pecado, mas vivos para Deus em Cristo Jesus" (Romanos 6: 6 a 11); "Portanto, já que vocês ressuscitaram com Cristo, procurai as coisas que são do alto, onde Cristo está assentado à direita de Deus" (Colossenses 3:1)
            Jesus Cristo foi crucificado, e com Ele a natureza da raça adâmica. Cristo Jesus foi ressurreto, e nós juntamente com Ele para uma nova vida guiada pelo mesmo Espírito que O ressuscitou dentre os mortos e que em nós fez morada, e de nós fez santuário de Deus: "Vocês não sabem que são santuário de Deus, e que o Espírito de Deus habita em vocês? Se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá; pois o santuário de Deus, que são vocês, é sagrado" (I Coríntios 3: 16 e 17).
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CONTINUA...

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

ÚLTIMOS QUE SÃO PRIMEIROS - Parte 3


Primogênitos Preteridos
 
            Todo esforço humano no sentido de alcançar Deus é inócuo. O homem só se chega a Deus quando este, por graça, se chega a ele, retirando-o de seu estado miserável e transportando-o do reino das trevas para o Seu Reino de luz. A religião, à parte da graça divina, é, portanto, ineficaz no seu propósito de "religar" o homem a Deus. É pela graça que somos salvos.
           Na primeira filiação humana vemos uma figura bem clara disso. Abel parece ter entendido que só a graça pode nos fazer chegar a Deus. Por isso sua oferta que apontava para o sacrifício de Cristo (a oferta de graça do próprio Deus) foi aceita. A oferta de Caim, um símbolo da religião, pois representava o fruto do esforço próprio, foi rejeitada. Caim, o primogênito, foi rejeitado. Abel, o mais novo, aceito.
            A herança do Reino de Deus só pode ser conquistada por graça do próprio Deus. Com efeito, não sendo nós filhos legítimos (pois desde a queda de Adão o pai espiritual do homem é o diabo), é preciso sermos adotados em Cristo, mediante a ação do Espírito Santo. Como já vimos, a lei (o filho mais velho) não pode fazer do homem participante do Reino. Pode, quando muito, ajudá-lo a levar uma vida "casta" e isenta de certos tipos de problemas. A graça (o filho mais novo) sempre esteve nos propósitos de Deus, por amor ao Seu próprio Filho, o Cordeiro que já havia sido crucificado desde antes da fundação do mundo.
            Essa questão foi muito bem representada na história da filiação do povo judeu. O primogênito, isto é, o filho mais velho, era aquele que haveria de suceder, de herdar os bens do Pai. JOHN DAVIS ensina: "Os primeiros filhos, nascidos de um casal, gozavam de certos direitos e privilégios que não eram partilhados pelos outros filhos mais moços. O filho mais velho, ordinariamente, gozava os direitos de sucessão na família de que se tornava chefe e representante". Sem embargo dessa rigorosa tradição familiar, na história dos patriarcas os mais novos, isto é, os "últimos" é que acabavam herdando. Os primogênitos eram preteridos.
            Abraão recebeu a promessa de uma grande descendência. A promessa, na realidade, apontava para Cristo, pois é em Cristo que Deus chama a Sua descendência, por meio da graça e da fé que se manifestam nEle e através dEle. O "filho da promessa" era Isaque. O "filho da carne", da incredulidade, do esforço próprio, foi Ismael, que foi o primeiro, o mais velho. Qual dos dois foi aceito? Isaque, o último, o mais novo. Ismael foi expulso porque, conforme Deus mesmo declarou a Abraão, "será por meio de Isaque que a sua descendência há de ser considerada" (Gênesis 21:12). 
            Isaque, por sua vez, teve 2 filhos: Esaú e Jacó. Quem deveria ser o herdeiro? Esaú, o primeiro, o mais velho. Qual dos dois foi aceito? Jacó, o último, o mais novo. Antes de nascerem, Deus já havia escolhido Jacó, alvo e figura de Seu amor gracioso: "Todavia, antes que os gêmeos nascessem ou fizessem qualquer coisa boa ou má - a fim de que o propósito de Deus conforme a eleição permanecesse, não por obras, mas por aquele que chama - foi dito a ela: "O mais velho servirá ao mais novo". Como está escrito: "Amei Jacó, mas rejeitei Esaú"" (Romanos 9: 11 e 12). Quem serviria quem? O mais velho serviria ao mais novo. A Lei serve à graça, e não o contrário. O propósito de Deus sempre foi manifestar a Sua graça. A Lei foi apenas um condutor para a realização de Seu propósito. É interessante que Jacó foi amado por Deus quando ainda no ventre de sua mãe. O que é isso? É graça! Pela Lei, Esaú seria o herdeiro, mas Deus moveu todas as circunstâncias de modo que a primogenitura passasse às mãos de Jacó. Mas não foi só isso. Jacó, que antes não conhecia a Deus, passou a se chamar Israel, depois de ter sido quebrantado, depois de haver lutado com um anjo do Senhor, experiência que aponta para a regeneração do pecador, operada mediante a morte e ressurreição com Cristo. Israel permaneceu por causa do propósito de Deus de chamar a Sua descendência em Cristo.
            Israel teve 12 filhos. O último, José, tornou-se o primeiro. Quem governou sobre quem? José foi posto em um alto lugar e governou sobre todos os demais irmãos.
            José teve 2 filhos: Manassés e Efraim. Ambos foram levados à presença de Israel, o avô, para receber deste a benção. Quem recebeu a benção da mão direita? Efraim, o último, o mais novo. Vejam que interessante: "Quando José viu seu pai colocar a mão direita sobre a cabeça de Efraim, não gostou; por isso pegou a mão do pai a fim de mudá-la da cabeça de Efraim para a de Manassés, e lhe disse: "Não, meu pai, este aqui é o mais velho; ponha a mão direita sobre a cabeça dele". Mas seu pai recusou-se e respondeu: "Eu sei, meu filho, eu sei. Ele também se tornará um povo, também será grande. Apesar disso, seu irmão mais novo será maior do que ele, e seus descendentes se tornarão muitos povos". E colocou Efraim à frente de Manassés" (Gênesis 48: 17 a 20).
            Parece difícil entender como os primeiros, os primogênitos, os mais velhos, foram preteridos dessa maneira. Trata-se, entretanto, de uma figura maravilhosa do propósito de Deus segundo a Sua graça, a qual está muito acima da Lei.
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quinta-feira, 4 de agosto de 2011

ÚLTIMOS QUE SÃO PRIMEIROS - Parte 2


A Lei e a Graça

            A questão de judeus (os que vivem sob a lei) e gentios (os que vivem sem lei) dá lugar à dicotomia "lei e graça". Ambas provêm de Deus, mas não podem coexistir. A graça nos é dada em Cristo, o qual representa o fim da Lei: "Todos recebemos da sua plenitude, graça sobre graça. Pois a Lei foi dada por intermédio de Moisés; a graça e a verdade vieram por intermédio de Jesus Cristo" (João 1: 16 e 17); "Há muito tempo Deus falou muitas vezes e de várias maneiras aos nossos antepassados por meio dos profetas, mas nestes últimos dias falou-nos por meio do Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas e por meio de quem fez o universo" (Hebreus 1: 1 e 2); "Nós, judeus de nascimento e não 'gentios pecadores', sabemos que ninguém é justificado pela prática da Lei, mas mediante a fé em Cristo Jesus. Assim, nós também cremos em Cristo Jesus para sermos justificados pela fé em Cristo, e não pela prática da Lei, porque pela prática da Lei ninguém será justificado" (Gálatas 2: 15 e 16); "Então a Lei opõe-se às promessas de Deus? De maneira nenhuma! Pois se tivesse sido dada uma lei que pudesse conceder vida, certamente a justiça viria da lei. Mas a Escritura encerrou tudo debaixo do pecado, a fim de que a promessa que é pela fé em Jesus Cristo, fosse dada aos que crêem. Antes que viesse essa fé, estávamos sob a custódia da Lei, nela encerrados, até que a fé que haveria de vir fosse revelada. Assim, a Lei foi o nosso tutor até Cristo, para que fôssemos justificados pela fé. Agora, porém, tendo chegado a fé, já não estamos mais sob o controle do tutor" (Gálatas 3: 21 a 25). Quem veio primeiro, a lei ou a graça? A Lei, certamente. E onde acaba a Lei? Em Cristo, o "unigênito vindo do Pai cheio de graça e de verdade" (João 1:14). Se alguém está em Cristo é nova criatura (II Coríntios 5:17). A graça é Ele mesmo, e a fé que nos justifica está nEle, que afinal é o autor e consumador da fé, conforme lemos em Hebreus 12:2. A Lei foi o tutor até Cristo. Mas vindo Cristo na plenitude dos tempos derramar "graça sobre graça", foi-nos outorgada a fé que nos justifica, tornando a lei arcaica. Moisés, a Lei e os profetas foram os "primeiros" que se tornaram "últimos" em face da presença de Cristo na vida daqueles em quem, por graça, o Espírito Santo, o Espírito de Cristo, faz morada, substituindo o princípio da lei pelo princípio da graça; a lei do pecado e da morte pela lei do Espírito de vida. Tendo chegado a fé, já não estamos sob o controle do tutor, isto é, da Lei. Alguns perguntariam: Então podemos pecar e fazer tudo o que for contrário à Lei? A dúvida assola a humanidade desde os primórdios da cristandade, mas Paulo já colocara bem a resposta: "De maneira nenhuma! Nós, os que morremos para o pecado, como podemos continuar vivendo nele? Ou vocês não sabem que todos nós, que fomos batizados em Cristo Jesus, fomos batizados em sua morte?" (Romanos 6: 1 a 3).

            A Lei dada a Moisés, que tantos acréscimos de homens sofreu, tornou-se, portanto, inócua na presença da graça. Cristo é o cumprimento da Lei. Os judeus, e todos quantos na atualidade estribam-se no cumprimento da Lei, buscando justificar-se por intermédio dela, estão sendo preteridos por aqueles que em Cristo estão sendo agraciados com o Reino de Deus (João 3: 3 e 5). Estes estão sendo regenerados por graça, de acordo com a vontade de Deus, para que o propósito de Deus conforme a eleição permaneça firme (Romanos 9:11).

            Logo, a Lei é um "primeiro" que passou a ser "último"; e a graça um "último" que passou a ser "primeiro". Por conseguinte, os gentios que estão sendo chamados por último estão entrando primeiro no Reino de Deus. Isto até que chegue a "plenitude dos gentios", conforme bem explica o apóstolo Paulo nos versículos 25 a 32 de Romanos 11. O próprio Jesus deixou transparecer em suas parábolas e em Seus ensinamentos que a lei precedeu à graça na linha do tempo, como também que a graça precede à lei no propósito eterno de Deus. 
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quarta-feira, 3 de agosto de 2011

ÚLTIMOS QUE SÃO PRIMEIROS - Parte 1

("Assim os últimos serão primeiros, e os primeiros serão últimos" - Mateus 20:16)
 

           Dentre as frases intrigantes (sob o ponto de vista humano) de Jesus, encontramos esta que nos serve de texto-base. Em algumas passagens dos evangelhos o Filho de Deus cuidou de lançá-la, como se vê a seguir: "Contudo, muitos primeiros serão últimos, e muitos últimos serão primeiros"- Mateus 19:30; "Contudo, muitos primeiros serão últimos, e os últimos serão primeiros" - Marcos 10:31; "De fato, há últimos que serão primeiros, e primeiros que serão últimos" - Lucas 13:30. Vemos, portanto, que se trata de uma verdade que se tornou enfática nos ensinamentos de Jesus, pois dela lançou mão repetidas vezes e em ocasiões distintas. Se tivesse afirmado apenas uma vez, já nos causaria curiosidade. Mas, como vemos, a verdade foi reafirmada e confirmada. Alguns, como fiz eu, se perguntam: o que significa "últimos que serão primeiros"?
            Não há registro nos evangelhos que revelem claramente o significado da assertiva. Nada obstante, Jesus deu uma dica importante ao usar a frase ao final da "parábola dos trabalhadores", a respeito da qual já tivemos oportunidade de escrever sob o título "Trabalhadores Sem Graça". A referida parábola trata da graça de Deus, da participação em Seu Reino, tendo Jesus deixado claro que os agraciados são aqueles que foram os "últimos" a serem chamados, mas os "primeiros" a serem recompensados, figurativamente querendo significar que foram os primeiros a entrar no "descanso do Senhor". Bem por isso Jesus declarou: "Digo-lhes a verdade: Os publicanos e as prostitutas estão entrando antes de vocês no Reino de Deus" (Mateus 21:31). Quem eram esses "vocês"? Certamente os judeus. Jesus veio para o que era seu, a saber, o povo Judeu. Mas os seus não o receberam, de maneira que "aos que o receberam (tanto gentios quanto judeus) deu-lhes o direito de se tornarem filhos de Deus, os quais não nasceram por descendência natural, nem pela vontade da carne, nem pela vontade de algum homem, mas nasceram de Deus" (João 1: 12 e 13 - comentamos).
            O que fica patente aqui é que a graça é para aqueles que se consideram falidos (tanto gentios quanto judeus). Os judeus, como povo, se consideravam escolhidos, mas julgavam-se tão importantes que queriam ser melhores do que o Filho de Deus e do que o próprio Deus, estribando-se nas leis, nas obras e nos próprios méritos, no alto conceito que faziam e fazem de si mesmos. Portanto, embora a promessa de Cristo tenha-se cumprido por intermédio dos judeus, os gentios estão tendo o privilégio de entrarem antes deles no Reino de Deus, por causa da graça soberana de Deus.
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terça-feira, 19 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 12

            É certo que a salvação do poder do pecado se desenvolve por graça, pela manifestação da vida de Cristo em nós, conforme já comentamos em outra oportunidade. Assim, nosso querer, embora regenerados, está sujeito à ação da graça divina. HORATIUS BONAR, em interessante artigo intitulado "A vontade de Deus e a vontade do homem" comenta que depois de regenerada, a vontade do homem ainda é uma seguidora, e não um guia. Muitas vezes relutamos em fazer a vontade de Deus, e isso falo por mim. São colocadas diante de nós várias situações cotidianas em que a Palavra de Deus nos vem claramente à mente, por manifestação do Espírito, revelando a vontade de Deus para cada situação específica, e ainda assim não manifestamos o desejo de realizá-la. Isso é possível? Sim, porque estamos sendo santificados na alma, na sede de nossa vontade. E a graça de Deus, o seu poder imenso transforma a nossa vontade segundo a vontade dEle, de maneira que o Seu propósito em nossa vida é levado a efeito nas circunstâncias mais triviais de nossa existência. Isso porque Deus disciplina àqueles que recebe como filhos.
CONCLUSÃO
            Vivemos tempos difíceis, em que os homens são arrogantes, presunçosos, amantes de si mesmos, mais amantes dos prazeres do que amantes de Deus. Qualquer doutrina que lhes imponham deveres inatingíveis e excluam o seu pretenso poder ou sua liberdade de escolha, o chamado "livre-arbítrio", é tida como heresia. Graças a Deus, a Sua soberania não muda, e a sã doutrina da graça nos revela que Deus é que é poderoso para realizar muito além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o Seu grande poder que em nós opera.
            Se devemos, mas não podemos nem queremos, peçamos a Deus que opere em nós o Seu querer e o Seu poder. Como disse M. ECKHART, "a alma deve ansiar por Deus a fim de se inflamar com o amor dele; mas, se ela ainda não puder sentir esse anseio, então deve ansiar pelo anseio. O anseio pelo anseio também vem de Deus".
            Os que já foram alcançados por esse amor não podem se esquecer de que "nós o amamos porque Ele nos amou primeiro" (I João 4:19). Sem Cristo nada podemos fazer. Em Cristo, podemos todas as coisas, porque Ele nos fortalece.
            Por fim, quero trazer uma meditação colhida do final do artigo último citado:
            "Por meio de uma simples manifestação de poder, Deus pode trazer de volta ao seu curso uma estrela perdida e permanecer inalterado diante da interferência das leis da natureza. Mas, como afirmam eles, estender Deus a sua mão e resgatar a vontade humana de seu caminho errado, para trazê-la de volta ao caminho de santidade, é um exercício injustificável de seu poder e uma usurpação da liberdade do homem! Que mundo! Neste mundo o homem segue todo o seu próprio caminho, e Deus não tem a permissão de interferir, exceto naquilo que o homem chama de legítimo! Que mundo! Neste mundo tudo se volta à vontade do homem, todos os acontecimentos do mundo ou na igreja são regulados, moldados, impulsionados somente pela vontade do homem. A vontade de Deus é algo secundário; seu papel é apenas contemplar os acontecimentos e seguir os passos da vontade humana. Neste mundo o homem deseja, e Deus tem de dizer: Amém!
            Em toda esta absoluta oposição à vontade de Deus, vemos a vontade própria dos últimos dias manifestando-se a si mesma. No princípio, o homem quis ser um deus e continua a lutar por isso nos últimos dias. Ele está decidido a fazer que sua vontade tome a precedência que pertence à vontade de Deus. No último anticristo esta vontade própria será sumariada e revelada. Ele é o rei que fará "de acordo com sua vontade". E na atual controvérsia do "livre-arbítrio", vemos demonstrado esse mesmo espírito. O anticristo está nos falando, exortando-nos à independência orgulhosa. A vontade própria é a essência da religião anticristã. É a raiz de amargura que hoje brota em muitas igrejas. Ela não procede do alto e sim de baixo; é terrena, animal e diabólica".
            Que o Deus de misericórdia, o Pai das luzes, o Deus de toda a graça, nos livre de querermos viver de acordo com a nossa própria vontade. Antes, que Ele nos conceda a graça de realizarmos a Sua vontade no tempo que nos resta de existência. Ele é fiel, e fará isso! Desenvolvamos, pois, nossa salvação...

segunda-feira, 18 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 11


            GILDÁSIO REIS foi feliz ao pontuar: "Diz-se que a vontade do homem é livre para decidir entre o bem e o mal. Mas é livre do quê? É livre para escolher o quê? A vontade do homem é a sua capacidade de escolher entre alternativas. A sua vontade de fato decide qual a sua ação entre um certo número de opções. Nenhum homem é compelido a agir contrário à sua vontade, nem forçado a dizer aquilo que não quer. Suas decisões não são formadas por uma força externa, mas por forças internas. A vontade toma decisões, e estas decisões tomadas não estão livres de influências. O homem escolhe com base nos sentimentos, gostos, entendimentos, anseios, etc. Em outras palavras, a vontade não é livre do homem mesmo. Suas escolhas são feitas pelo seu próprio caráter. Sua vontade não é independente de sua natureza".
            Aqui é que bate o ponto. O homem natural, morto em delitos e pecados, só é livre para fazer o que o seu coração mal dita. Seus sentimentos distorcidos, seu conhecimento do bem e do mal segundo seu código axiomático contaminado pelo pecado o compele a optar segundo sua vontade egoísta. É uma questão de natureza e, conseqüentemente, de tropismo. Enquanto a raiz busca o solo (geotropismo), a folha busca a luz (fototropismo). Enquanto o homem natural busca seus próprios interesses e a satisfação da carne, o homem espiritual busca os interesses do Alto e a atuação do Espírito. Como disse Paulo, "quem vive segundo a carne tem a mente voltada para o que a carne deseja; mas quem vive de acordo com o Espírito, tem a mente voltada para o que o Espírito deseja. A mentalidade da carne é morte, mas a mentalidade do Espírito é vida e paz; a mentalidade da carne é inimiga de Deus, porque não se submete à lei de Deus, nem pode fazê-lo" (Romanos 8: 5 a 7).
            Daí se vê claramente que ao homem natural, que é dominado pela carne, é impossível se submeter à lei de Deus e ao Espírito Santo. É por essa razão que ele precisa ser vivificado antes de qualquer coisa. Antes de crer, o homem precisa ter vida, pois ele está morto espiritualmente. Se nessa condição ele não consegue entender as coisas do Espírito de Deus, como poderia crê-las ou mesmo desejá-las? A vontade, portanto, é escrava de seu senhor, e o senhorio sobre homem natural é exercido pelo pecado, um estado de incredulidade e suposta independência em relação a Deus que por conta própria qualquer descendente de Adão não quer e nem pode admitir.
            Mas o texto base nos fala da operação da vontade divina, que é boa. Segundo a boa vontade de Deus, Ele opera em nós tanto o querer quanto o realizar. Assim, quando o incrédulo começa a sentir o desejo de crer, já é manifestação da graça e do poder de Deus. Lembro-me do testemunho de minha amada mãe, a respeito de uma certa sobrinha sua que lhe externou a vontade de crer no Evangelho que ela cria, ao que respondeu: "Essa vontade já é manifestação da graça de Deus". De fato, com ela, comigo, e com qualquer outra pessoa que tenha passado "da morte para a vida" há a lembrança de quando Deus começou a obra de convencimento do pecado e de desejo de ser liberto da velha natureza adâmica. Não fosse a graça divina, nosso querer jamais teria sido movido em direção à cruz, isto é, à morte da velha natureza.
            Portanto, o querer ser salvo também é divino, de sorte que nem a vontade exercemos no sentido da salvação. Quando queremos ser salvos de nós mesmos podemos ter a certeza de que é a graça divina operando.
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sexta-feira, 15 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 10

            MARTINHO LUTERO declarou: "a prova máxima do pecador é ele não conhecer o seu próprio pecado". Em sua clássica obra "A Escravidão da Vontade", o mártir da reforma protestante explica com muita propriedade que o "livre-arbítrio" foi perdido com a queda, de maneira que a liberdade de um escravo do pecado é uma contradição de termos, e só pode ser exercida no sentido do próprio pecado. Existe uma lei operando em seus membros: a lei do pecado. Assim como a lei da gravidade opera no universo atraindo todos os corpos ao centro da terra, a lei do pecado atrai para baixo aqueles que estão sob seu domínio.
            É preciso, portanto, uma nova lei que liberte o homem dessa escravidão: é a lei do Espírito de vida, que vigora através da graça divina revelada em Cristo.
            Ao refutar as idéias de Erasmo de Roterdã a respeito do "livre-arbítrio" escreveu LUTERO: "Você assevera que o "livre-arbítrio" é a capacidade que a vontade humana tem, por si mesma, de decidir se aceita ou não a palavra e as obras de Deus. Isso equivale a fazer com que a vontade humana seja capaz de escolher entre o céu ou o inferno. Isso significa que não há espaço para a atuação do Espírito Santo ou para a graça divina. Isso põe a vontade humana no mesmo nível de Deus. Os pelagianos também fizeram isso. Mas você os ultrapassa! Eles distinguiam em duas parte o "livre-arbítrio" - o poder de compreender a diferença entre as coisas e o poder de escolher entre elas. Porém, para você o "livre-arbítrio" tem o poder de escolher coisas eternas, embora seja totalmente incapaz de entendê-las. Desse modo, você criou um "meio livre-arbítrio". Além disso, você contradiz a si mesmo, porquanto uma vez afirmou que "a vontade humana nada pode fazer sem a graça divina". No entanto, quando você chegou a escrever uma definição do "livre-arbítrio", concedeu total liberdade para a vontade humana. Você é um homem muito estranho! Prefiro até mesmo o ensinamento de alguns filósofos aos seus. Eles diziam que um homem entregue a si mesmo só faria o que é errado. O homem só poderia escolher o bem com a ajuda da graça divina. Eles diziam que os homens são livres para decair, mas que precisam de ajuda para elevarem-se! Porém, é motivo de riso chamar a isso de "livre-arbítrio". Com base em tais conceitos, eu poderia afirmar que uma pedra tem "livre-arbítrio", pois só pode cair, a menos que seja erguida por alguém! O ensino daqueles filósofos, porém, ainda é melhor do que o seu. A sua pedra, Erasmo, pode escolher se sobe ou desce!" (in "Nascido Escravo", Ed. Fiel, 1a. edição, 1992, p. 40/41).
            O ensinamento de Lutero tem respaldo na Palavra de Deus e vem corroborar o que queremos demonstrar quanto à vontade humana. Se a liberdade do homem é direcionada no sentido da queda, isto é, do pecado, não se trata de liberdade. A questão não envolve apenas atitudes, mas a natureza do homem. Este, ainda que faça o bem, não pode alcançar a Deus ou a salvação que vem dEle mediante suas obras. Todavia, o problema é ainda mais grave. O homem natural não apenas não pode buscar a Deus, mas também não quer fazê-lo. Sua vontade é escrava de sua natureza pecaminosa. O Salmista descreve bem essa situação: "O Senhor olha dos céus para os filhos dos homens, para ver se há alguém que tenha entendimento, alguém que busque a Deus. Todos se desviaram, igualmente se corromperam; não há ninguém que faça o bem, não há nem um sequer" (Salmos 14: 2 e 3). No Capítulo 53, versos 2 e 3 do mesmo livro vemos essa verdade repetida, a qual foi transcrita por Paulo em Romanos 3: 9 a 20.
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quinta-feira, 14 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 9

QUERER

            Diz-se que o homem antes da queda detinha a liberdade da vontade, o que se convencionou chamar de "livre-arbítrio". Tal liberdade o homem a tinha em si mesmo, estando portando sujeito a perdê-la, o que efetivamente foi feito após a escolha errada em face da errônea interpretação quanto ao "não comerás". A liberdade de escolha, ou o livre exercício da vontade, era por assim dizer mutável, por isso Adão a perdeu quando pecou.
            A Confissão de Fé de Westminster, em seu Capítulo IX, seção 2, declara: "O homem, em seu estado de inocência, tinha a liberdade e o poder de querer e fazer aquilo que é bom e agradável a Deus, mas mutavelmente, de sorte que pudesse decair dessa liberdade e poder". Concordamos em parte com a doutrina esposada. A liberdade humana antes da queda era limitada, porque a liberdade verdadeira e plena só pode ser conquistada em Cristo. Ademais, o homem só pode ser agradável a Deus "no Amado". Como dissemos no primeiro estudo da série, o dever-ser é, sempre foi e sempre será Cristo. A queda, uma revelação de que a liberdade sem Cristo é um mito. Depois da queda, a "liberdade" se tornou escravidão, pelo que o "posse non peccare" agora se transformou em "non posse non peccare", o que exclui qualquer possibilidade de o homem cooperar na questão de sua salvação.
            DEVERN F. FROMKE, a propósito, comenta: "Quando Adão primeiramente apareceu no maravilhoso Jardim do Éden, ele foi colocado naquele nível intermediário: em liberdade. A escolha que ele tinha diante de si era ou tornar-se um escravo de amor para Deus, ou tornar-se um escravo debaixo da lei. Desde o momento em que Adão escolheu seu próprio caminho egoísta, toda a raça humana tem necessitado de uma lei exterior para refrear suas inclinações egoístas. Seria maravilhoso se pudéssemos começar, como Adão, naquele nível intermediário de liberdade. Mas todos, por causa de suas inclinações interiores para o egoísmo e rebelião contra Deus, necessitam de um Salvador para tirá-los da escravidão e do pecado" ("Supremo Propósito", p. 141).
            Além de não ser possível ao homem salvar-se, ou cooperar na salvação (por incapacidade e ausência de permissão divina), também não faz parte de sua constituição o querer ser salvo. Com efeito, defrontando-se com a idéia dicotômica de céu e inferno, é lógico e razoável que queira o céu. Ninguém quer ficar "queimando no inferno", como bem disse C. D. COLE. Todavia, quando se trata de aceitar a salvação em sua inteireza, envolvendo aí a libertação do "eu" e do pecado, o ser humano, por conta própria, não se manifesta favorável. Como pode alguém negar a si mesmo? Como pode querer ser liberto de si mesmo? É essa a proposta do Evangelho: Morte para o "eu" e vida para Deus em Cristo. Isso o homem natural não quer, até porque não entende o Evangelho por si só. O homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura, e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente, como nos ensina Paulo em I Coríntios 1: 9 a 16. O Evangelho permanece encoberto para aqueles que estão se perdendo. Para que sejam salvos, é mister uma intervenção divina, através do Seu Espírito, para convencer o homem de seu estado pecaminoso, de cegueira e morte espiritual.
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quarta-feira, 13 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 8



            O poder para realizar algo, isto é, a capacidade ou a permissão, ou ambos os fatores conjugados, não tem o condão, por si só, de tornar esse algo suscetível de realização. É mister que esteja presente o elemento volitivo. Quem nunca ouviu a frase "faltou vontade política?". Sem vontade, política ou não, o homem não se dispõe a prosseguir em seus ideais, sonhos ou projetos, pessoais ou coletivos. Sob o prisma inverso, é muito popular a idéia do "querer é poder". Há muitas pessoas que seguem esse lema de vida: se eu quero, eu posso. Se o poder não prescinde do querer, este de forma ousada propõe-se a mover as circunstâncias internas e externas em prol dos objetivos da vontade.
            Essa idealização do querer muito se assemelha à filosofia do "Príncipe" de Maquiavel, segundo a qual "o fim justifica os meios". Em outros termos, se eu quero, nada poderá me impedir de concretizar meus ideais. Nossa vontade é um fator importante de expressão da personalidade, e por isso mesmo um fator delicado e perigoso. Alguém já disse: "Tome cuidado com aquilo que deseja; você pode conquistá-lo". A lição aí é a de que nem sempre desejamos coisas adequadas e benéficas.
            No que concerne à salvação do espírito, da alma e do corpo, pois é esse o enfoque dessa série de meditações, o homem natural não exerce a vontade da maneira que convém, nem poderia fazê-lo, pois a nossa vontade é escrava do pecado desde que nascemos. É dito que o homem dispõe de liberdade de escolha, o chamado "livre-arbítrio" e, portanto, pode e deve manifestar seu desejo na direção da sua salvação. É nesse sentido que se repetem dominicalmente os apelos nos púlpitos de muitas igrejas ditas cristãs. Cumpre alertar, entretanto, que a idéia faz muito bem ao ego, mas está totalmente divorciada da verdade, pois ao arrepio da Palavra de Deus.
            É certo que o homem dispõe de liberdade para realizar muitas coisas. Contudo, não é livre para deixar de pecar. Se o fosse, para que o sacrifício do Cordeiro que tira o pecado do mundo e que nos liberta paulatinamente do poder do pecado? SANTO AGOSTINHO distinguiu muito bem a situação do homem, antes e depois de ser salvo:

ANTES DO PECADO
Posse non peccare
DEPOIS QUE PECOU
Non posse non peccare
DEPOIS DA REGENERAÇÃO, COM O CORPO TERRENO
Posse non peccare
DEPOIS DA REGENERAÇÃO, COM O CORPO CELESTIAL
Non posse peccare

            No quadro acima identificamos o homem natural na 2a. realidade, em que o pecar é uma possibilidade natural, e o não pecar uma impossibilidade.
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terça-feira, 12 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 7

            Nesse aspecto da salvação, portanto, cabe a Deus-Pai o cuidado com os filhos que adotou em Cristo, e esse cuidado é eterno, e se realiza pela santidade da vida do Filho. Nele reside a plenitude da divindade, e nEle somos desenvolvidos por graça, segundo a iniciativa, a vontade e o propósito divinos. Em Hebreus 10:14 lemos que o sacrifício de Cristo aperfeiçoou de uma vez por todas aqueles que estão sendo santificados. Logo, o que Deus desejava realizar por meio de Cristo em minha vida Ele já realizou, de acordo com o Seu propósito eterno, e por meio dos eternos efeitos do sacrifício do Cordeiro. A manifestação disso no tempo é que nos confunde, mas para Deus não há passado, nem presente, nem futuro, e o que Ele queria realizar por intermédio do Filho está realizado.
            Se é verdade que não participamos do processo de redenção, também não participamos da santificação. Dela somos meros recipientes, não agentes. Como crianças recém-nascidas dependemos totalmente de Deus e, portanto, necessitamos do “puro leite espiritual”. Não somos capazes de nos tornar mais santos do que somos, nem nos é permitido fazê-lo. O Espírito Santo é que produz a vida do Santo em nós, e nos desenvolve ao longo de nossa existência terrena até aquele ponto em que Deus já determinou. Lembremo-nos de que todos os nossos dias já estavam contados antes mesmo de virmos à existência (Salmos 139:16).
            Em uma terceira fase, temos a salvação da presença do pecado, a saber, a glorificação do corpo. Talvez nessa fase seja mais perceptível a soberania e o poder de Deus. Isso porque nenhum salvo sabe quando vai morrer, e quando morrer estará sujeito a uma realidade preparada por Deus, tendo a promessa futura de novos céus e nova terra, em que o pecado não se manifestará, pois o que é corruptível (carne e corpo) se revestirá de incorruptibilidade. Corpos terrenos serão transformados em corpos espirituais, conforme nos ensina Paulo em I Coríntios 15: 45 a 57. Em Filipenses 3:21, referindo-se ao nosso Salvador e Senhor, Paulo escreve: “Pelo poder que o capacita a colocar todas as coisas debaixo do seu domínio, ele transformará os nossos corpos humilhados, tornando-os semelhantes ao seu corpo glorioso”.
            A regeneração do espírito, a santificação da alma e a glorificação do corpo são, portanto, fases do viver do salvo em que a manifestação da graça e do poder de Deus se fazem presentes, nada havendo em nós que possa contribuir de alguma maneira para o sucesso da empreitada. Deus age soberanamente e graciosamente em nós, de maneira que possamos começar a entender, e louvar, a Sua glória, o Seu poder e a Sua graça. O Salmista bem percebeu essa atuação completa ao declarar: “É ele que perdoa todos os seus pecados e cura todas as suas doenças, que resgata a sua vida da sepultura e o coroa de bondade e compaixão” (Salmos 103: 3 e 4). Espírito, alma e corpo são recipientes da ação divina, e por causa da Sua fidelidade Ele nos apresentará perante Ele mesmo santos e irrepreensíveis: “Que o próprio Deus da paz os santifique inteiramente. Que todo o espírito, a alma e o corpo de vocês sejam preservados irrepreensíveis na vinda de nosso Senhor Jesus Cristo. Aquele que os chama é fiel, e fará isso” (I Tessalonicenses 5: 23 e 24).
            Deus se apresenta em Sua Palavra como o “Todo-Poderoso”. Nele, de fato, está todo o poder. O que é impossível para o homem é perfeitamente possível para Deus. Por isso, o maior exemplo de cristão concluiu que nEle, isto é, naquele que o fortalecia, era possível ao apóstolo suportar ou estar contente em qualquer situação. Judas, por sua vez em sua doxologia, revela em quem está o poder: “Àquele que é poderoso para impedi-los de cair e para apresentá-los diante da sua glória sem mácula e com grande alegria, ao único Deus, nosso Salvador, sejam glória, majestade, poder e autoridade, mediante Jesus Cristo, nosso Senhor, antes de todos os tempos, agora e para todo o sempre! Amém” (Judas 24).
            Destarte, em todas as esferas da salvação, inclusive aquela que somos instados a desenvolver (ou, a por em ação), vemos que a ação é, na realidade, divina, segundo a operação da graça e do poder de Deus. Quando reconhecemos que nada podemos em nós mesmos, mas que Deus tudo pode, começamos a experimentar a atuação do Seu poder. Como bem disse JOHN OWEN, “Não teremos nenhum poder de Deus, a não ser que sejamos convencidos de que não temos nenhum poder em nós mesmos”. Graças a Deus, esse convencimento é obra dEle, que opera na fraqueza. Temos um tesouro em vasos de barro, isto é, a vida de Cristo em corpos corruptíveis, para que entendamos que a excelência do poder é de Deus, e não nossa (II Coríntios 4:7). A nossa força, que não é nossa, está na nossa fraqueza.
            Glórias sejam dadas ao Deus eterno por Sua maravilhosa graça revelada no Evangelho, que opera em nós uma salvação completa, de acordo com Seu grande poder, segundo o beneplácito da Sua vontade.
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segunda-feira, 11 de julho de 2011

DEVER, PODER E QUERER - Parte 6

            O Deus da Palavra não age assim. Isso Ele nos revela nas seguintes declarações: “O Senhor é muito paciente, mas o seu poder é imenso; o Senhor não deixará impune o culpado” (Naum 1:3-a); “Absolver o ímpio e condenar o justo são coisas que o Senhor odeia” (Provérbios 17:15); “O Senhor é muito paciente e grande em fidelidade, e perdoa a iniqüidade e a rebelião, se bem que não deixa o pecado sem punição” (Números 14:18-a). Logo, se Cristo tivesse morrido pelo pecador, e este permanecesse ileso, Deus seria injusto e mentiroso. Todavia, a Palavra revela a justiça de Deus por meio do Evangelho (Romanos 1:17), e este declara que Cristo morreu na cruz, mas o pecador morreu juntamente com Ele (João 12: 32 e 33). A condição de morto para o pecado e vivo para Deus (Romanos 6: 10 e 11) é transmitida em Cristo a todo aquele que foi regenerado, isto é, que foi gerado novamente, desta feita não mais do cruzamento de espermatozóide e óvulo humanos, mas da ação conjunta da Palavra de Deus e do Espírito Santo (João 3: 1 a 21).
            O único que poderia passar pela morte de cruz sem ser retido por ela transmite a todo o que crê a Sua vida. Ninguém pode morrer por conta própria, nem muito menos viver uma vida ressurreta. Ademais, se não nascemos na carne segundo a nossa vontade, mas segundo a vontade de nossos pais, na vida espiritual tal realidade se verifica, de sorte que somos feitos filhos de Deus segundo a vontade dAquele que nos gerou (João 1:10 a 13).
            Na segunda etapa da salvação não há mais condenação. A sentença de morte já não pesa sobre nós, uma vez que já foi cumprida no corpo de Cristo. Por essa morte da qual nos tornamos participantes somos justificados, mediante a fé. Agora, o que nos é exigido é CRUZ DIÁRIA, NEGAÇÃO DO “EU”, SUBMISSÃO DA VONTADE e OBEDIÊNCIA. Não é preciso digressões para concluir que todas essas exigências da vida cristã são impraticáveis do ponto de vista humano.
            Na salvação do poder do pecado, que se dá no âmbito da alma, temos o desenvolvimento da vida de uma pessoa em nós, por isso a chamamos de vida cristã: é a vida de Cristo. Na vida do “eu” podemos dizer que nos desenvolvemos pelo cuidado inicial de nossos pais e tutores e, posteriormente, pelo nosso próprio cuidado com nossa subsistência e desenvolvimento físico, mental e sentimental. Agora, no homem espiritual, tais aspectos continuam precisando de cuidados, mas eles não constituem a essência do ser. O viver do homem espiritual é Cristo, e o morrer já não é prejuízo, pois ele vive no plano do eterno, não do efêmero. O homem natural deposita suas forças, riquezas e esperanças em coisas e pessoas deste mundo. Sua vida está confinada no tempo e no espaço à realidade visível e material. Já o homem espiritual tem uma viva esperança, isto é, uma esperança que não se apaga com as circunstâncias, nem com o advento da morte física. Essa esperança é Cristo. Ela é viva e eterna porque Cristo é a própria vida eterna. 
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